Volta às aulas: momento de redobrar cuidados com as questões emocionais
NITERÓI - Com o retorno das aulas presenciais autorizado a partir desta semana para a rede privada da cidade, as escolas e as famílias têm um desafio ainda maior no acolhimento de crianças e adolescentes, além dos cuidados com os protocolos sanitários e a retomada do conteúdo pedagógico após quase um ano de aulas on-line: a atenção aos aspectos emocionais.
Pesquisadora da UFF, a professora Priscilla Oliveira Silva Bomfim lidera um estudo sobre o impacto da pandemia na saúde mental de crianças e adolescentes. Coordenadora do Núcleo de Pesquisa, Ensino, Divulgação e Extensão em Neurociências do Programa de Pós-Graduação em Neurociências do Instituto de Biologia, ela conta que propôs o debate a sua equipe a partir da observação na mudança comportamental do seu filho de 5 anos durante o período de isolamento social.
— A maneira como as crianças processam a informação é muito diferente da dos adultos. Como mãe e com cabeça de cientista, comecei a observar os sinais que ele estava me dando. Percebi que ficou mais irritado e retraído. Não queria mais dormir sozinho, ficou com medo de tudo. Na época, imaginei como estariam os filhos de pais que trabalham na linha de frente, por exemplo, e comecei a buscar dados bibliográficos de pandemias, epidemias, furacões. Nessa literatura, vimos relatos de crianças que foram acompanhadas até os 18 anos e desenvolveram transtornos. Fui juntando isso para que a comunidade científica também olhasse para essas crianças e adolescentes que estão vivendo a pandemia de Covid-19— explica.
O estudo destaca tendências ao desenvolvimento de doenças como depressão e/ou ansiedade, problemas psicológicos como maior preocupação e tendência à irritabilidade e disfunções do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, que regula a atuação de substâncias-chave do cérebro, conduzindo a problemas relacionados aos sistemas imunológico, endócrino e nervoso.
A pesquisadora diz que a proposta, agora, é continuar olhando para essa população e fazer um acompanhamento a longo prazo.
— Famílias e crianças precisam de suporte psicológico, especialmente as que apresentaram relatos de alterações na pandemia. Precisamos de dados para contribuir para as próximas situações que certamente virão — diz.
Coordenador de turno e disciplina do Colégio Miraflores, o psicólogo Mauro Dias destaca que o abalo emocional dos alunos é um dos principais “ecos da pandemia”.
— Independentemente da pandemia, sempre tivemos esse olhar diferenciado para os alunos. Diante do enorme desafio de adaptar a escola ao projeto de ensino à distância, percebemos que essa mudança gerou um nível de ansiedade grande em todos, na equipe pedagógica e, especialmente, nos alunos. Criamos no ambiente virtual o mesmo ambiente que temos na escola, que é a “Sala do Mauro”, onde tenho um contato individual com eles para dar suporte às questões comportamentais. Antes do Enem, desenvolvi um trabalho que chamo de oficina de ansiedade. A adesão ao presencial foi muito grande, então acredito que, neste primeiro momento, nosso principal desafio será auxiliar os alunos a conter a ansiedade sem a quebra dos protocolos sanitários que precisam ser respeitados — pondera.
Uma das ações do Miraflores para mitigar os impactos emocionais nos alunos foi oferecer aulas de ioga.
— Muitos alunos ficaram tristes, angustiados e deprimidos por não verem mais outras crianças. No segundo semestre de 2020, começamos a fazer as aulas on-line. Em janeiro, na colônia de férias, fizemos ioga de forma presencial. Agora, ela está inserida na grade curricular. Tivemos relatos muito positivos dos pais — diz Danielly Lemos, professora de ioga e educação física.
No Estação do Aprender, a psicóloga Luana Medeiros realiza atendimento presencial quatro dias por semana. Em 2021, a profissional terá uma atuação ainda mais intensa.
— O momento é de muito acolhimento. Na semana que vem, quando voltarmos presencialmente, estarei acompanhando de perto cada criança. Além disso, tenho encontros com as turmas, quando conversamos sobre temas importantes e promovemos reflexões individuais e coletivas, estimulando os alunos a entenderem melhor seus sentimentos — explica.
Fonte: O Globo