Temer entrega ajuda ao Líbano e diz que Brasil pode ajudar a 'harmonizar' conflito interno

Temer entrega ajuda ao Líbano e diz que Brasil pode ajudar a 'harmonizar' conflito interno
O ex-presidente Michel Temer chega a Beirute levando ajuda do Brasil Foto: Natália Rabahi

BEIRUTE — Uma semana após a devastadora explosão na área portuária de Beirute, aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB) descarregaram no Aeroporto Internacional Rafic Hariri, nesta quinta-feira, seis toneladas em alimentos, medicamentos e equipamentos de saúde. A comitiva chefiada pelo ex-presidente Michel Temer, a pedido do presidente Jair Bolsonaro, pousou horas depois.  

— O povo brasileiro está “empenhadíssimo” em auxiliar o Líbano — comentou o ex-presidente ao desembarcar em Beirute, afirmando que a ajuda humanitária fortalece ainda mais o que chamou de “relação fraterna e politicamente sólida” entre o Brasil e o Líbano. 

A diáspora libanesa no Brasil tem cerca de 12 milhões de pessoas, entre elas, o ex-presidente — quase o dobro da própria população libanesa, atualmente estimada em 6,8 milhões de pessoas, de acordo com o Banco Mundial. Segundo o Itamaraty, há hoje mais de 20 mil brasileiros vivendo no Líbano.

O general libanês Albert Hyar agradeceu a missão humanitária ao Líbano:

— Muito obrigado ao governo, ao povo brasileiro — disse em português.

Formada por senadores, autoridades federais e membros da comunidade libanesa no Brasil, a comitiva seguiu do aeroporto para encontro com o presidente Michel Aoun no Palácio Presidencial de Baabda, a 10 quilômetros do porto de Beirute, onde ocorreu a explosão de 2.750 toneladas de nitrato de amônio que devastou parte da cidade.

Hospitais destruídos

Em seguida, o ex-presidente se reuniu com líderes das diferentes confissões religiosas na residência da Embaixada do Brasil em Beirute, onde comentou sobre o encontro com o líder libanês:

— Dissemos que o Brasil está inteiramente às ordens, não só para a ajuda humanitária mas para ajudar a promover um inter-relacionamento saudável dentro do Líbano —  disse Temer.

As explosões da semana passada reiniciaram os protestos contra a classe política e o sistema de governo sectário, e levaram à renúncia do primeiro-ministro Hassan Diab, após seis meses no cargo. Segundo Temer, a missão de ajuda humanitária, ou qualquer outra ajuda que o governo brasileiro prestar ao Líbano no futuro, não se trata de um interesse eleitoral ou político, mas de um interesse do povo libanês.

— Devo dizer até que este é o desejo de todos os libaneses que residem no nosso país. Eles querem um Líbano pacificado — completou o ex- presidente.

O monsenhor Boulos Matar, ex-arcebispo maronita de Beirute, agradeceu à missão brasileira e acrescentou:

— [Os libaneses] são um povo trabalhador, é um povo que merece viver com paz, e viver com solidariedade.

Devastação

Reforçando a necessidade de apoio internacional, o presidente da Cruz Vermelha local, Antoine Zoghbi, explicou que, “devido à situação que o Líbano atravessa, todas as ajudas são necessárias. Os hospitais libaneses, a Cruz Vermelha, precisam de muita ajuda”. Segundo Zoghbi, cerca de 2,5 toneladas dos insumos recebidos do Brasil, na tarde de quinta-feira, serão destinados à Cruz Vermelha. O Exército libanês ficará  a cargo das outras quatro toneladas.

Até o momento, a megaexplosão já deixou mais de 170 mortos, 6 mil feridos e cerca de 300 mil desabrigados, com outras dezenas de pessoas ainda desaparecidas.

Vários hospitais de Beirute foram afetados: o Hospital de São Jorge, no bairro de Achrafieh — um dos mais danificados —, foi evacuado enquanto a equipe médica realizava os atendimentos de emergência poucos minutos após a tragédia. A administração do centro médico confirmou a morte de quatro enfermeiras, 12 pacientes e um visitante, além de mais de mil feridos, com três em condições críticas.

Em redes sociais, os libaneses pedem que o incidente seja investigado por uma corte internacional, já que o governo local não possui a confiança da população. Em visita a Beirute nesta quinta, o número três da diplomacia americana, David Hale, disse que o FBI vai trabalhar com investigadores libaneses e internacionais para apurar as causas da explosão.

— Eu acho que isto vai depender do governo, […] conversei com o presidente Bolsonaro hoje pela manhã, e quem sabe,[…] nós poderíamos colaborar para a harmonização de toda esta questão aqui no Líbano — comentou o ex-presidente Temer, que na sexta-feira se encontrará com o presidente do Parlamento, Nabih Berri, e com Diab antes de retornar ao Brasil.

Estado de emergência

A chegada da missão brasileira ocorre em um dia tenso em Beirute, marcado por protestos e pela primeira sessão parlamentar desde as explosões. O Legislativo endossou o estado de emergência, proclamado pelo Gabinete no dia 5. Com validade de duas semanas, a medida dá ao Exército o poder de limitar a liberdade de expressão, reunião e da imprensa, além de permitir a prisão de qualquer um considerado como ameaça. Grupos defensores dos direitos humanos temem que isto seja usado propositalmente para perseguir opositores.

Nesta quinta, manifestantes cercaram o Palácio Unesco, onde a sessão parlamentar aconteceu, demandando reformas políticas. Todos os acessos ao local, no sul de Beirute, foram bloqueados com grades de metal. Dois carros que se dirigiam ao centro de convenção foram atacados com pedras por um grupo que protestava com bandeiras libanesas.

Presidente do Parlamento desde 1992, Berri defendeu que "a formação de um novo governo seja rápida". Pilar do regime, no entanto, ele não deverá ouvir as demandas por uma reforma do sistema político libanês, que prevê a participação no governo dos principais grupos religiosos do país. Tradicionalmente, o presidente é um cristão, o premier é muçulmano sunita, e o presidente do Parlamento, muçulmano xiita.

Além de Temer, a comissão brasileira conta com o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, os senadores Nelsinho Trad (PSD-MS) e Luiz Osvaldo Pastore (MDB-ES) e o secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência, Flávio Augusto Rocha, entre outros. Acusado de corrupção passiva e outros crimes no âmbito da Operação Lava-Jato, o ex-presidente precisou de autorização judicial para poder comandar a missão a Beirute, concedida pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, na segunda-feira. (Com agências internacionais)

Fonte: Natália Rabahi/O Globo