'É muito sofrimento', diz viúva que acusa PMs de matarem mototaxista na Cidade de Deus

Ao chegar ao Instituto Médico Legal, na Leopoldina, região central do Rio, na manhã desta quarta-feira, Miriam dos Santos, de 49 anos, fez um desabafo sobre a morte de seu marido. O mototaxista Edvaldo Viana, de 42 anos, foi baleado na noite desta terça-feira, durante uma abordagem por parte de policiais do 18º BPM (Jacarepaguá) na Rua Edgard Werneck, na Cidade de Deus, na Zona Oeste do Rio. A pessoa que estava na garupa também morreu. A Corregedoria da PM apura a ação. O fuzil de um dos agentes foi recolhido e passará por uma perícia.
— Eu cheguei lá e ele estava morto. É muito sofrimento. Esses homens vão para a rua para matar inocente. Eles só matam inocente. No mesmo local onde há seis meses mataram outro inocente — disse Miriam.
Ela, que acusa os policiais militares de não terem dado qualquer ajuda, mostrou uma das cápsulas da bala que afirma ter matado Edvaldo:
— Eram duas (cápsulas). Mas no desespero não sei onde a outra foi parar.
Miriam disse que o marido morava na Gardênia Azul, região próxima à Cidade de Deus, e garantiu que a moto dele era legal.
— A moto do meu marido não é moto roubada. É moto comprada com suor — afirmou.
A mulher contou ainda que, ao chegar ao local, foi comunidade com frieza por um PM sobre a morte de Edvaldo:
— Eu cheguei e ele ainda estava lá. Falou: "meus sentimentos". Eu falei: "meu marido está morto?". Ele não rodeou nem nada.
Dois 'gansos' morreram
Enteado de Edvaldo, Paulo Henrique dos Santos Duarte disse que os PMs se referiram ao mototaxista e à outra pessoa morta como "ganso" — termo que muitos policiais usam para se referir a suspeitos.
— Chegamos lá, tinha algumas viaturas, perguntamos e falaram: os dois "gansos" já morreram e já levaram. Falei: não é "ganso", não — contou ele.
Paulo disse que após alguma dificuldade conseguiu atravessar a rua. E logo viu o sangue no chão. O rapaz relatou que algumas pessoas afirmaram que seu padrastro havia sido morto por PMs depois de fazer uma bandalha no trânsito:
— Um pessoal que estava no lava-jato falou: colega, seu padrasto parou a moto e eles, de dentro do carro, dispararam, seu padrasto caiu e eles desceram do carro e atiraram no outro. Todo mundo saiu falando a mesma coisa: que ele simplesmente foi fazer a bandalha onde todo mundo faz e sempre acontece isso. Seis meses atrás foi com outro rapaz. Foi mais um que entrou para a estatística. E agora aconteceu com meu padrasto.
A mulher de Paulo, que está grávida de cinco meses, foi ao local do crime e passou mal. Ele contou ter sido impedido por policiais de ir até onde ela estava.
— Não deixaram atravessar (a rua). Minha esposa foi pra casa e a levei para a (maternidade) Leila Diniz — disse.
Corregedoria apura ação
Em nota, a Polícia Militar informou que o secretário da corporação, coronel Rogério Figueredo de Lacerda, determinou que a Corregedoria da PM apure a ação ocorrida na Rua Edgard Werneck, em Jacarepaguá. De acordo com a corporação, "os policiais do 18ºBPM (Jacarepaguá) que participaram da ocorrência foram ouvidos na Delegacia de Homicídios da Capital e um fuzil da equipe foi recolhido para perícia".
Após as mortes, moradores realizaram um protesto e tentaram bloquear ruas. Homens do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) atuaram junto às equipes do 18º BPM para estabilizar a região.
Outra morte em janeiro
Em janeiro deste ano, Marcelo Guimarães, de 38 anos, passava de moto pela Rua Edgard Werneck quando foi atingido por um tiro e morreu. Na época, a Polícia Militar afirmou que havia um confronto no local — versão negada por moradores da Cidade de Deus.
Também morador da Gardênia Azul, Marcelo foi descrito por amigos como um homem trabalhador e honesto. Ele trabalhava numa marmoraria e estava de moto quando foi baleado.
Fonte: Extra/Globo.com