Sheik usava baú de ouro para atrair e convencer clientes sobre lastro de criptomoedas
Umas das estratégias usadas por Francisley Valdevino da Silva, conhecido como o 'sheik' das criptomoedas, era apresentar dois baús repletos de ouro para impressionar os potenciais investidores sobre lastro do negócio. Enquanto uma das caixas mostrava barras de 1 kg, a outra apresentava grande quantidade de esferas chamadas “zelts” (ouro em lituano), cada uma com cerca de 10 gramas e um valor estimado em mais de R$ 3 mil. Entre os clientes lesados no esquema está a filha de Xuxa, Sasha Meneghel.
Conhecido apenas como Francis da Silva, ele é dono da Rental Coins, empresa aberta em janeiro de 2019 com proposta de alugar criptomoedas dos investidores, prometendo no início pagar juros de 0,5% a 5% ao mês e devolver os ativos do cliente ao final de um ano de contrato. Após atrair uma legião de clientes, alguns famosos, ao oferecer lucros mensais de até 13,5% do valor investido, ele viu o negócio ruir quebrou e legou aos investidores um deserto de esperança.
Para impressionar os potenciais investidores, Francis fazia questão de recebê-los em uma sala no décimo andar da sede da empresa, em Curitiba. Um dos investidores do negócio, o pastor Silas Malafaia nega envolvimento com criptomoeda. A pequena revolução financeira promovida por Francis teria encantado o pastor. Ele montou com o 'sheik' a AlvoX, empresa de marketing de relacionamento multinível, que oferece recursos tecnológicos para quem quer abrir o seu próprio negócio dentro dos valores cristãos.
O fervor cristão, diz o ex-amigo, abriu as portas do mundo gospel para o 'sheik'. Pastores, cantores e fiéis acreditaram no esquema. Um deles foi Sasha Meneghel, filha de Xuxa, que conheceu o negócio de Francis por frequentar um templo evangélico. Empolgados, ela e o marido, o cantor João Figueiredo, fizeram aportes que totalizaram R$ 1,2 milhão. Em abril deste ano, após o calote, ambos processaram o empresário na Justiça de Curitiba.
Sheik começou limpando animais em pet
Paulista, ele começou como funcionário de uma pet shop. Limpava animais de estimação. Após o primeiro fracasso em negócio próprio com a venda de roupas, mudou-se para tentar a sorte em Curitiba. Com um pequeno capital, montou uma empresa de marketing multinível - modelo de distribuição de bens em que os ganhos podem advir da venda efetiva dos produtos ou do recrutamento de novos vendedores. Seis meses depois, sofreu acusações de criar uma pirâmide financeira e resolveu partir para os Estados Unidos.
Chegou à Flórida em 2016, segundo ele, com US$ 20 no bolso. O prognóstico da mãe começou a acontecer quando um homem, que Francis diz ter conhecido no supermercado, o apresentou às bitcoins. Depois de trabalhar em uma empresa de marketing de relacionamento, abriu a sua própria operadora, mas - por motivos que não explica - acabou voltando para Curitiba no ano seguinte e abriu na capital paranaense a Intergalaxy, pioneira do seu grupo.
O grande salto do sheik foi dado no ano seguinte, quando a Receita Federal baixou a portaria RFB 062018 e considerou o criptomoeda um bem intangível - propriedade que não existe fisicamente - e permitiu operações de aluguel deste ativo. Com a criação de uma nova empresa, a InterAG, Francis fechou o primeiro contrato de aluguel em 16 de janeiro de 2019 e não parou mais, numa escalada de juros ofertados que chegou a 13,5%.
Crise nos negócios e atrasos nas contas
Os atrasos começaram em outubro do ano passado. Dois meses depois, ele parou completamente o pagamento dos aluguéis. Alegou que a empresa passava por uma reengenharia e propôs um acordo com os investidores - cerca de 40 mil, aproximadamente - que previa o ressarcimento em 38 prestações. Para aderir, porém, o cliente precisava assinar um acordo em que abria mão de eventuais ações judiciais.
Chegou a pagar as primeiras parcelas, mas esse ano a fonte do sheik secou em definitivo, causando revolta e desespero. A pretexto de reformular o site do grupo, esse mês ele tirou do ar a plataforma que informava os investimentos individuais. Para os clientes, o objetivo foi apagar as provas de que embolsou uma fortuna e deu um calote coletivo.
— Por eu já ter localizado alguns bens e saber que hoje podemos penhorar cripto moedas inclusive no exterior pelos protocolos internacionais de cooperação, existe a possibilidade de ressarcimento real — disse Jeferson Brandão, advogado de um grupo de clientes lesados.
Fonte: O Globo