MPF pede para PF apurar suspeita de fraude na Casa da Moeda após denúncia de associação em SP

MPF pede para PF apurar suspeita de fraude na Casa da Moeda após denúncia de associação em SP
O Banco Central (BC) lançou nesta quarta-feira (02/09) a nova nota de R$ 200,00 com a imagem do lobo-guará — Foto: Raphael Ribeiro/BCB

O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro pediu para a Polícia Federal (PF) apurar a suspeita de fraude no transporte de material de dentro da Casa da Moeda, que também fica no Rio, após denúncia feita por uma associação em São Paulo.

De acordo com a Associação Brasileira de Combate à Falsificação (Abcf), com sede na capital paulista, a Ceptis, empresa do Rio que venceu a licitação para fornecer a tinta para imprimir as novas notas de R$ 200, reclama que a Casa da Moeda tem fornecido sua tinta, de forma irregular, para concorrentes. Um deles é Sellerink, que fica na Zona Sul de São Paulo.

A associação reuniu documentos que apontam a movimentação dos materiais fora da Casa da Moeda. A entidade procurou o MPF no Rio e o Núcleo de Repressão a Falsificação de Moeda da Polícia Federal, que fica em Maringá, no Paraná, para investigarem a denúncia.

A Abcf entende que o transporte do material da Casa da Moeda para a empresa concorrente está colocando em risco o segredo industrial das tintas, que são produtos químicos de segurança.

“Se não fossem elas [as tintas] não teríamos como identificar o que é dinheiro falso e o que é dinheiro original. Cobrar as autoridades para que sejam ouvidos os responsáveis, para entender quem deu essa ordem, quem autorizou e que essas pessoas sejam punidas tanto na esfera administrativa quanto criminal”, disse Rodolpho Ramazzini, diretor da Abcf. “Precisa ser apurado imediatamente”.

A segurança contra a falsificação é tão complexa que poucas empresas são credenciadas para disputar a concorrência e fornecer as tintas para a Casa da Moeda brasileira.

Denúncia

Há mais de quatro décadas, a Sicpa, uma fábrica que fica na cidade de Lausanne, na Suíça, é a principal fornecedora de tintas para o Brasil imprimir dinheiro.

Numa carta enviada à Casa da Moeda, no último dia 31 de agosto, a representante dela no Brasil, a Ceptis, diz que no ano passado recebeu uma denúncia de que "amostras de suas tintas estariam sendo fornecidas, pela casa da moeda, a uma nova fornecedora de tintas".

A Sellerink também está credenciada para fornecer tintas para impressão de dinheiro. Mas, na carta, a fábrica suíça diz que "o compartilhamento de suas tintas com outras empresas configuraria grave violação à sua propriedade intelectual bem como à segurança nacional".

A carta foi enviada cinco dias depois que a casa da moeda emitiu essa nota fiscal para o transporte de amostras de tintas. Algo obrigatório quando se leva qualquer produto de uma empresa para outra.

De acordo com a nota fiscal, duas caixas foram retiradas da Casa da Moeda no dia 26 de agosto deste ano, por uma transportadora com sede no Aeroporto Internacional de Brasília, que fez a entrega à Sellerink Indústria e Comércio de Tintas e Vernizes, em São Paulo.

Segundo a nota, dentro das caixas estavam 16 amostras de tintas usadas na impressão das novas notas de R$ 200. Cada amostra de tinta tem 100 mililitros, uma quantidade que cabe em potes.

A Ceptis, que representa a empresa Suíça, disputou com a Sellerink uma licitação para produzir a tinta da nota de R$ 200. E a empresa suíça ganhou sozinha essa concorrência. Por isso, afirma que essa entrega das amostras para a concorrente é ilegal.

Procurada, a Sellerink não comentou o assunto.

Casa da Moeda

A Casa da Moeda reconhece que enviou as amostras de tinta para a empresa Sellerink, de São Paulo. Afirma que essa prática já ocorreu antes, para aumentar o número de possíveis fornecedores. E que não houve qualquer irregularidade.

“Acontece que as amostras foram, de fato, enviadas. Essa carta não trata exatamente dessas 16 amostras. A carta trata de envio de tintas porque nós somos uma empresa pública e como empresa pública a gente precisa desenvolver fornecedores, nós somos, inclusive, questionados por isso pelos órgãos de controle. Então a gente precisa desenvolver fornecedores. Então, há uma prática, sim, de envio de amostras. Nós não enxergamos esse risco, do jeito que lhe falei, porque é uma prática comum entre as empresas. A própria Ceptis já recebeu tinta da Sellerink”, diz Alexandre Grilo, porta-voz da Casa da Moeda.

A Casa da Moeda declara, ainda, que também fez isso porque houve problemas com a tinta da Ceptis, que venceu a concorrência para a nota de R$ 200.

“A gente já tem inclusive devoluções feitas para o próprio fornecedor Ceptis. Eles ainda tão tentando acertar essa tinta. Sendo que nós tivemos vários problemas de qualidade com esse fornecedor e nós precisávamos construir uma contingência para não parar o mês circulante do dinheiro”, fala Grilo, que admitiu que as amostras de tinta da Ceptis foram enviadas para a Sellerink.

Sindicato

O sindicato que representa os funcionários da Casa da Moeda afirma que retirar insumos de dentro da instituição não é comum.

“Quando há qualquer problema na produção dos seus insumos, especificamente falando aqui da tinta, é feita uma comunicação com a empresa responsável por aquele insumo, aquela tinta, e aí um técnico dessa empresa responsável ele vai até a Casa da Moeda e lá é feito todo trabalho de estudo pra saber o problema que está dando. Nunca houve essa ação de haver um problema no insumo de uma empresa e levar amostras desse mesmo insumo para uma outra empresa”, diz Roni Oliveira, presidente do Sindicato Nacional dos Moedeiros, com sede no Rio de Janeiro.

Fonte:  César Galvão, Roberta Giacomoni, Robinson Cerântula e Willian Santos, Jornal Hoje — São Paulo