Cover de Roberto Carlos guarda pedaço de bolo que ganhou 20 anos atrás do cantor

Cover de Roberto Carlos guarda pedaço de bolo que ganhou 20 anos atrás do cantor
Carlos Evanney exibe bolo que ganhou em aniversário de Roberto Carlos (Foto: Arquivo pessoal)

A voz rouca e suave se intercala com risos cadenciado, frases terminadas com o vocativo “bicho” e trechos cantados de sucessos como Detalhes e Emoções. A voz do outro lado do telefone parece a de Roberto Carlos, mas na verdade é de seu cover e um de seus maiores fãs, Carlos Evanney. Há 21 anos, ele conta que vive de Roberto e para o Roberto, que nesta segunda (19), completa 80 anos.

“Vivo de Roberto e para Roberto desde 2000, quando entendi e aceitei o meu papel no mundo. Sou fã dele desde menino, fanático, mas por muitos anos não quis assumir porque tinha medo de ser apenas mais um imitador. Depois, entendi que era algo divino. Deus me colocou no mundo para ser cover do Roberto. Ele sabia que o Roberto ia ser um grande cara e que não ia dar conta de tudo, poder estar em todos os lugares... Deus me fez para estar nos lugares onde Roberto não poderia mais estar, bicho”, conta ele. “Tudo é graças a Deus, que me deu essa aparência. Tenho a mesma altura e o mesmo físico.”

Sua paixão pelo cantor começou aos 7 anos quando ouviu pelo rádio do vizinho a música Malena. Acostumado a ouvir Nélson Gonçalves, Angela Maria e Orlando Silva, Evanney parou de jogar as bolinhas de gude com os amigos em Maragogipe, na Bahia, para se aproximar do rádio e saber quem era o dono daquele timbre tão diferente.

“Eu ouvi pela primeira vez Roberto Carlos aos sete anos, quando estava na porta de casa brincando de bola de gude. Quando ouvi Roberto no rádio do vizinho cantando Malena, fiquei encantado com aquela balada diferente, a voz bem suave e a interpretação maravilhosa. Daí, começou a tocar mais músicas dele, veio a Jovem Guarda... Só gente rica tinha TV naquela época e eu pedia para uma vizinha me deixar assistir o Roberto em sua casa. Eu puxava os outros garotos para ver Roberto. Sentava no chão de frente para TV preta e branco e depois tentava imitar o cabelo, o jeito de falar”, relembra.

Foi a vontade de conhecer o Rei que o fez se mudar para o Rio de Janeiro, onde começou a trabalhar como cenógrafo no Theatro Municipal e a cantar em bares.

“Em 76, uma prima da minha mãe que morava no Rio fez uma visita a minha casa. Pedi para ela me levar para o Rio porque eu queria conhecer Roberto Carlos e tentar a carreira de cantor.  Ela voltou para o Rio, falou com o marido e depois me mandou carta dizendo que eu podia vir. Fiquei na casa dela e passei a cantar em barzinhos. Para me manter, meu tio conseguiu um trabalho para mim como cenógrafo no Theatro Municipal e lá que eu conheci um cara que me deu o ingresso para o primeiro show do Roberto”.

A emoção em estar no mesmo espaço que Roberto Carlos tomou conta de Evanney que confessa ter chorado e gritado muito durante a apresentação.

“O primeiro show foi logo quando cheguei no Rio. Eu sempre cantava Roberto Carlos enquanto trabalhava. Todos ficavam impressionados com a semelhança. Um rapaz me viu e me deu um ingresso para ver o Roberto. Foi na Concha Acústica dos Universitários. Foi uma emoção muito grande. Chorei, gritei e me emocionei. Eu tinha pintado uma camisa com rosto. Ele cantando e olhando para mim. Me notou. O Rei me viu, bicho! Imagina a minha alegria. Desde então, passei a ir em todos os shows.”

PRIMEIRO ENCONTRO

Em 2000, quando um amigo lhe deu a ideia de ir na frente do prédio de Roberto Carlos para, assim como os outros fãs, celebrar o aniversário do Rei, Evanney teve um outro momento memorável.

“No dia 19 de abril de 2000 resolvi ir na frente do prédio dele. Tinha gente pra caramba lá. Quando cheguei e saltei do táxi, várias pessoas vieram em cima de mim. E comecei a puxar ‘Tanto tempo longe de você, quero ao menos lhe falar, a distância não vai impedir, meu amor, de lhe encontrar’”, cantarola.

“De repente, Roberto apareceu na sacada do prédio e me mandou um beijo. Perdi a linha nesta hora. Fui para o meio da rua, os carros quase me atropelando e eu gritando: ‘Roberto eu te amo, meu rei’. Ele lá de cima olhando para mim e botando a mão no peito para me agradecer. Saí de lá dez horas da noite e no mesmo ano decidi que só ia cantar Roberto. O primeiro show que fiz como cover lotou. Há 21 anos sou cover do Roberto com todo carinho, amor e dedicação.”

O encontro frente a frente, no entanto, aconteceu um ano depois, quando ele voltou ao prédio para celebrar a nova idade do Rei. A então secretária do cantor, o chamou para acompanhar uma fã que tinha levado um bolo, que seria cortado por Roberto. Evanney até hoje guarda o pedaço do bolo, que ele diz ter sido entregue em suas mãos pelo próprio ídolo.

“Em 2001, fui novamente para lá ao lado da minha filha Roberta Carla. Em um momento, a secretária dele me chamou pelo nome. Nem sabia que ela sabia meu nome. Ela me disse: ‘Vou botar você dentro do carro do Roberto com o motorista dele dirigindo porque o Roberto precisa ir para o estúdio e não está conseguindo sair com toda essa multidão. Você topa’. Topei, mas no final apareceu uma fã com um bolo para o Roberto. Ele decidiu que ia cortar esse bolo antes de sair e a secretária chamou algumas pessoas para entrarem no prédio. Entrei com a minha filha e fiquei quietinho lá, tentando me controlar. O Roberto apareceu e cortou quatro pedaços do bolo, dobrou um guardanapo e me entregou a última fatia: ‘Esse é para você, bicho’. Eu fiquei igual estatua, sem reação. Depois consegui agradecer. Tenho esse pedaço de bolo até hoje, com o guardanapo dobrado por ele. Com o tempo, as formiguinhas vieram, mas eu botei o bolo no sol por uma semana e depois passei verniz nele. O bolo fica na estantezinha que eu tenho com várias recordações do Roberto”, afirma.

Desde então, ele coleciona encontros. “Sempre que chego dou abraço bem forte e beijo ele. Ele até ri. Às vezes brinca: ‘Deixa de ser bobo, Evanney’. Ele também já falou no meu ouvido: ‘Parabéns pelo trabalho que você vem fazendo’. Quando não pode me atender, pede para alguém vir pedir desculpa. Ser notado por ele já é um presente. Roberto Carlos é amor puro. Como se fosse uma criança, sem nenhum tipo de maldade. O sorriso do Roberto Carlos é a coisa mais pura. Ele não sorri se não tem motivo. Ele não te olha se você não chamou atenção dele. Ele é alegria! Parece que Deus entra no Roberto Carlos. Você sente que algo está acontecendo com você. Não vejo um ser humano ali, vejo uma coisa divina, um ser iluminado.” 

SINTONIA

Neste ano, Evanney não vai para frente da casa de Roberto. Ele diz que sente que o ídolo ficaria triste se ele desrespeitasse as regras de isolamento social devido à pandemia. O baiano garante que tem uma conexão meio sobrenatural com o Rei.

“Vou mandar a orquídea que todo ano envio para ele, fazer uma oração por ele e à noite faço uma live só com as músicas do começo da carreira. Gostaria de ir para frente da casa dele, mas como sei que ele não vai gostar de me ver lá na pandemia, não vou. A gente vive uma sintonia muito grande. Se Roberto está triste, estou triste e se ele está feliz, estou feliz. Minha felicidade é a do Roberto. Sei o que ele está pensando, o que vai dizer e até o que vai vestir no dia. Várias vezes, a gente estava com a mesma roupa”.

Evanney diz que até herdou TOC e manias de Roberto Carlos. “Também tenho TOC como ele. Não uso outras cores que não sejam azul e branco, não gosto de chinelo emborcado, não passo embaixo de escada e procuro sair pela mesma porta que entrei.”

Ele tem até medo toda vez que um evento acontece na vida do Rei porque sabe que algo semelhante vai acontecer na sua vida.

“Quando morava em Maragogipe com 7 anos, no início da Jovem Guarda, o Roberto morava na Gomes Freire. Anos depois, fui morar sem saber, na mesma avenida, no número 502. O dele era 501. A mãe do Roberto foi morar com Deus aos 96 anos. Minha mãe também se foi com 96 anos. Agora na pandemia, o Roberto perdeu um irmão. Na hora fiquei preocupado com o meu irmão. Ele pegou Covid e morreu dias depois. São várias coincidências”, avalia ele, que nasceu em maio, um mês depois do ídolo, mas que diz desconhecer a sua idade já que perdeu a certidão. 

SHOWS

Apesar de ter tido que cancelar vários show por causa da pandemia, Evanney garante que tem conseguido se manter com o que guardou como cenógrafo e como cover. Ele espera poder voltar logo a se apresentar e a fazer também seu cruzeiro Emoções na Guanabara. 

“Em março do ano passado fiz meu último show com público. Vários outros shows foram cancelados e só agora em março fiz um show live no teatro Rival. Mas mesmo sem trabalho, tenho vivido bem dentro da minha simplicidade. Sempre fui um cara pé no chão, não bebo, não fumo, não gasto com futebol... Sou caseiro. Estou tranquilo porque soube guardar alguma coisa. Não que eu tenha dinheiro, mas o que eu economizei como cover eu guardei. Só gastava com as contas e necessidades. Hoje estou vivendo do que economizei e também tenho meu apartamento que comprei com o dinheiro como cenógrafo. Não sei o dia de amanhã e por isso sou um cara simples e que economiza.”

Fonte: Quem News/Globo.com