Com debandada no Twitter, plataforma já pode ter perdido quase 70% do pessoal
O ultimato de Elon Musk saiu pela culatra. Depois de o bilionário avisar aos funcionários do Twitter que ou eles concordavam com uma carga de trabalho elevada ou se demitiam, a rede social sofreu uma debandada, que ameaça até mesmo seu funcionamento. Na sexta-feira, a empresa fechou seus escritórios, que só reabrirão na segunda-feira, e todos os engenheiros de software foram convocados para uma reunião urgente com Musk — que chegou a postar na plataforma um enigmático “enterro do Twitter”, com a hashtag #RIPTwitter.
Segundo relatos, uma rede interna de mensagens do Twitter foi inundada por mensagens de despedida. Os sites estimavam o número de trabalhadores que optaram por sair entre mil e 1.500, segundo o jornal The Washington Post.
Considerando que, assim que assumiu o Twitter, há cerca de três semanas, Musk demitiu metade dos 7.500 empregados na companhia, estima-se que a plataforma já tenha perdido quase 70% de seu pessoal.
— É um cenário bastante sombrio — disse à Bloomberg o engenheiro de sistemas Glenn Hope, que já passou por Facebook e Instagram. — A quantidade de conhecimento perdido é simplesmente impressionante, provavelmente algo sem precedente.
Ele e outros especialistas alertaram para o que a debandada de pessoal pode significar para o Twitter. A plataforma exige constante manutenção e ajuste em seus sistemas — sem isso, pequenos problemas podem se transformar em grandes falhas, que poderiam causar falha na segurança e permitir acesso aos dados dos usuários.
A plataforma também pode ficar mais lenta durante um período de forte movimentação de usuários, como comentários durante um jogo da Copa do Mundo.
— É um cenário de pesadelo para qualquer empresa, ainda mais uma empresa de tecnologia — disse à Bloomberg Chester Wisniewski, cientista pesquisador da companhia de cibersegurança Sophos.
Tentativa de recuo
Alguns dos funcionários que se demitiram disseram à agência Bloomberg, sob condição de anonimato, que o Twitter pode enfrentar dificuldade para resolver problemas ou mesmo atualizar seus sistemas, já que muitos dos que partem levam consigo o conhecimento sobre o funcionamento da empresa.
Musk percebeu o movimento: na tentativa de convencer alguns funcionários a não se demitirem, admitiu rever a política de proibição total do home office. Em e-mail aos empregados, ele disse que seria possível trabalhar remotamente, desde que o gerente de área assumisse a responsabilidade. Mas ressaltou que todos deveriam ter reuniões pessoais com os colegas ao menos uma vez por mês.
Foi uma mudança significativa de tom em relação ao ultimato, no qual ele dizia que as pessoas podiam esperar trabalhar 80 horas por semana, com menos benefícios no escritório.
O prazo final do ultimato era 17h de quinta-feira, horário de São Francisco, onde fica a sede do Twitter. na madrugada de quinta para sexta-feira, o site Downdetector relatou falhas pontuais na rede social — que foi inundada de hashtags como #GoodbyeTwitter, #Twitterdown e #Twittershutdown, além de #RIPTwitter, segundo o site Gizmodo.
Apesar disso, na plataforma, Musk afirmou que o Twitter havia registrado um novo recorde de usuários.
O Gizmodo relata ainda que, já na quinta-feira, vários sistemas cruciais já não tinham mais qualquer engenheiro de manutenção.
Um ex-funcionário do Twitter disse ao Post ter conhecimento de seis sistemas críticos que não tinham mais nenhum engenheiro na equipe. Segundo ele, “não há nem uma equipe básica para cuidar do sistema, vai continuar a rodar até esbarrar em algo, então vai parar.”
De acordo com o site The Verge, as equipes que cuidam de tráfego e interface com usuário praticamente acabaram. E todos da equipe que administrava os sistemas centrais de biblioteca, usados por todos os engenheiros, pediram demissão. Um dos demissionários falou que “sem esse pessoal o Twitter não funciona”.
Outra divisão desfalcada foi a do Twitter Blue, o selo de verificação a ser relançado no próximo dia 29 —uma das principais apostas de Musk para aumentar a receita da plataforma, com a cobrança de US$ 8 pelo selo. Segundo o site Platformer, o engenheiro-chefe e a equipe de designers deixaram o projeto na quinta-feira.
Sem moderação
Outros relatos apontam que todos nas equipes de folha de pagamento, relatórios fiscais e tributária deixaram a empresa. Musk acabou com o departamento de comunicação do Twitter, então não havia ninguém para comentar o assunto.
O Post informou ainda que metade da equipe de política de segurança saiu na quinta-feira. É o pessoal encarregado de identificar desinformação, spam e contas falsas. A equipe de moderação de conteúdo, em sua maior parte terceirizada, também sofreu um forte baque. Musk demitiu cerca de 4.400 pessoas, de um total de 5.500.
Especialistas apontam que isso tornará praticamente impossível o Twitter seguir as determinações de órgãos reguladores sobre conteúdo de ódio e fake news. A demora na identificação e retirada desses conteúdos pode acarretar multas milionárias para a empresa.
Muitos usuários já abriram conta em redes menos conhecidas, como a Mastodon, criada por um alemão, e a indiana Koo. O veterano Tumblr também é visto como opção.
Enquanto isso, Musk anunciou ontem uma nova “política de liberdade de expressão”.
“Tuítes negativos/com discurso de ódio perderão impulso e monetização, então nada de anúncios ou outra receita para o Twitter. Vocês não acharam o tuíte a não ser que procurem especificamente por ele, como ocorre no resto da internet”, afirmou Musk em um post.
Na noite de quinta-feira, a sede do Twitter recebeu projeções na fachada. Eram termos nada favoráveis a Musk, como “bebê falência”, “pústula petulante”, “bajulador de ditadores”, “oligarca desregrado”, “colonizador inseguro” e “acumulador cruel”. Ninguém assumiu a autoria.
Fonte: O Globo/Negócios