Empate do PSG prova que dinheiro compra talentos, mas fazer um time é menos simples do que parece

Empate do PSG prova que dinheiro compra talentos, mas fazer um time é menos simples do que parece
Messi lamenta uma chance perdida pelo PSG contra o Brugge — Foto: KENZO TRIBOUILLARD / AFP

Considerado o melhor técnico de vôlei do século XX, o argentino Julio Velasco é uma fonte em que beberam, inclusive, grandes técnicos de futebol. Certa vez, disse algo a que muitos resistem, mas que não perde atualidade: “Dez Maradonas e um grande goleiro formam o melhor time possível? Não. Todos os grandes jogadores da história levavam na palma das mãos outros não tão bons quanto eles. Porque precisavam de quem corresse, passasse e os protegesse... Um time se faz com jogadores diferentes. E a diferença faz a equipe funcionar.”

Recordar este pensamento após a pálida estreia do PSG na Liga dos Campeões pode induzir à conclusão de que o time de Messi, Neymar e Mbappé está condenado a não funcionar. Mas esta conclusão é impossível a esta altura. É cedo para decretar o desastre ou para prever um time de sonhos.

Não há como ignorar que a imensa qualidade técnica tem todas as chances de render vitórias. Ainda assim, o empate na Bélgica reforçou a tese de Velasco. O produto final de um time de futebol não é a soma de seus talentos, de suas capacidades individuais. Mas o trabalho que permite tornar tais talentos complementares, um coletivo harmônico em que as individualidades brilhem. É claro que quando se junta Messi, Neymar e Mbappé, todos os prognósticos são favoráveis, as probabilidades jogam a favor. Mas o futebol não é ciência exata. É difícil dizer quando e se estes craques irão formar um conjunto afinado. Da forma como se apresentou, o time francês terá dificuldades para competir. Há imensos ajustes para o argentino Mauricio Pochettino fazer. E o trabalho é mais difícil do que se imagina quando, simplesmente, lemos nome por nome de uma escalação estelar.

Contra um bem organizado Brugge, que aliás foi melhor do que o PSG em boa parte do primeiro tempo, o time francês sofria a cada perda de bola. Em especial porque havia muito pouca pressão para recuperá-la rapidamente, em especial da linha de atacantes. E nem é possível, ou justo, falar em astros egoístas ou desconectados do coletivo. É uma questão de características, de perfis e de momentos de carreiras. Naturalmente, haverá passagens do jogo em que não irão reagir imediatamente a cada desarme sofrido.

O resultado foi a quantidade de vezes que uma cena se repetiu: fosse uma corrida de Sowah ou de Lang pelos lados, fosse uma condução de Vanaken pelo centro ou um deslocamento do centroavante De Ketelaere, o Brugge contragolpeava com decisão diante de uma defesa exposta e obrigada a correr na direção da própria área. Era comum o PSG se defender com sete homens, os quatro defensores e o trio de meias. Neymar, que partia da esquerda, era quem mais frequentemente recompunha, mas a esta altura já não é o ponta capaz de cobrir todo um corredor. Messi já não participava da pressão ofensiva, muito menos da recomposição, no Barcelona. Afinal, precisa poupar pernas aos 34 anos. Mbappé, partindo do centro do ataque, também não parecia ter tal incumbência.

Houve momentos bonitos com a bola, e esta é a maior certeza que este time pode oferecer. Da construção do gol ao chute de Messi na trave, o talento sempre produzirá lances para apreciar. Mas, para competir, há fatores bem mais complexos envolvidos. Inclusive na parte ofensiva, o que é natural num trio de protagonistas que ainda buscam conhecer uns aos outros. O funcionamento não é automático. No entanto, é a sensação de desequilíbrio sem bola o sinal mais alarmante do 1 a 1 na Bélgica.


No segundo tempo, Pochettino trocou Paredes e Wijnaldum, este último ainda parecendo sem entender seu lugar no meio-campo, por Danilo e Draxler. Tentou ganhar fôlego, mas também ter Danilo como um terceiro zagueiro na hora de atacar, liberando os laterais e buscando uma ocupação de espaços mais equilibrada.

Este PSG oferece preciosa lições. Uma, a de que o dinheiro compra talentos, mas a construção de um time competitivo envolve fatores muito mais complexos. Nem sempre um agrupamento de craques resulta, já no primeiro encontro, no time que se fantasiou quando a contratação de Messi virou notícia mundial. A equipe forte, harmônica e campeã pode surgir, porque não lhe falta talentos. Mas também é fato que o futebol não oferece garantias ou fórmulas prontas. A busca por transformar num time competitivo uma das maiores reuniões de astros globais que o jogo já viu será uma das grandes histórias desta temporada.

Fonte: Carlos Eduardo Mansur/Globoesporte.com